2 de ago. de 2009

' Uma Janela Aberta - Sexo Tântrico e Sagrado (prosa poética V)

Estávamos sentados à luz da vela,
O corpo tremia, o coração batia forte,
Uma garrafa de vinho ao lado de nós, transpirávamos desejo - Não desejo que vemos, mas desejo que imaginamos;
O desejo solto no ar, que vibra, que enche a vida com a vontade ferverosa de ter alguma coisa, de ter alguém;
O desejo que move montanhas, que nos dá uma sensação de completa liberdade, desejo, apenas desejo, no seu estado mais puro, no seu estado mais divino;
Desejo que é a fonte de tudo o mais além, o mais abaixo, o mais acima, o mais infinito.

Desejo que traz o prazer sexual em si. Porque foi possível a experiência prazer sexual sem sequer tocarmos no outro. Energia sexual entra em jogo antes mesmo do sexo ter lugar.

Nus,
Sem se tocarem, estavam sentados à luz da vela,
O corpo tremendo, o coração batendo forte,
Uma garrafa de vinho ao lado deles.





Em quase absoluta escuridão, ele sabia o que queria
Ele sabia o que eu queria,
Mas ele não me podia dar nada, essa foi a maçã que Eva nunca deveria ter trincado.
Colocámos uma venda nos olhos e sentimos a nossa própria respiração, o inspirar e expirar que vai, que vem -
O ar, vital, mútuo.
Sentimos extrema dor em não tocar -
Não a dor que deixa ferida, mas uma dor divina;
A dor que nos guia a um tipo diferente de paraíso;
A dor no seu estado mais puro, levada ao extremo, levada ao limite, até um lugar de imensa e misteriosa paz, de um ecxtasy religioso indescritível;
A dor que se transforma em alegria; que nos leva ao limite.
A dor que trás o único sentido à vida: o prazer.

Expliquei-lhe então que só quem conhece essas fronteiras, esses limites, da dor extrema, sabe vida. Tudo o resto é só passar o tempo, repetindo as mesmas tarefas, envelhecer e morrer sem nunca ter descoberto o que estávamos afinal a fazer aqui - a escola? o trabalho? o casamento, os filhos, a televisão, a amargura, a velhice, a sensação de ter perdido muitas coisas, a frustração, a doença, a incapacidade, a dependência dos outros, a solidão, a morte. Somos seres humanos, nascidos cheios de culpa. Sentimo-nos aterrorizados quando felicidade se torna uma possibilidade real, e morremos a querer punir todos os outros, porque nos sentimos impotentes, inúteis e infelizes. As experiências mais importantes um homem pode ter são aqueles que o levam aos seus próprios limites - sexo, desejo, amor e dor são tudo experiências extremas. Cruzando as fronteiras do nosso próprio corpo, aí sim, encontramo-nos. Só sabemos quem somos quando nos deparamos com nossos próprios limites. Mas não é necessário saber tudo sobre nós mesmos ... o ser humano não foi feito exclusivamente para ir em busca da sabedoria, mas também para lavrar a terra, para esperar a chuva, plantar o trigo, a colheita do grão, fazer o pão.

Em quase absoluta escuridão, ele sabia o que queria
Ele sabe o que ela queria,
Mas ele não lhe podia dar nada, essa foi a maçã que Eva nunca deveria ter trincado.
Era um limite inultrapassável,
O fruto mais apetecido.



Utilizando apenas o meu sentido táctil, despejei meio copo de vinho na minha taça.
Ao preparar-me para encher o seu copo, ele pegou no meu pulso, impediu-me,
Pegou na minha taça e disse - esta é uma taça que iremos partilhar.
Tirei a minha venda, tirei a venda dele, olhei-o nos olhos.
Se partilhássemos aquela taça, estaríamos já a tocar um no outro;
Estaríamos a partilhar os nossos corpos, as nossas vidas;
Agora, era tempo de partilhar apenas as nossas almas, os nossos seres entrecruzados por um espaço e um tempo que só existiram ali -
- naquele sítio onde Deus fez um círculo, há muitos milhares de anos atrás.
O pecado original não foi aquele em que Eva comeu a maçã, mas sim a sua convicção de que era necessário partilhar com Adão precisamente o que ela tinha provado. Eva tinha medo de seguir seu caminho sozinha. Bem, certas coisas não podem ser partilhadas.

Bebi o meu vinho. Fui totalmente livre na minha entrega.

Beberam o vinho silenciosamente. Voltaram a encher o copo vezes sem conta. Voltaram a bebê-lo silenciosamente vezes sem conta. Porque o silêncio era o grito mais forte.
Ali, naquele sítio onde Deus fez um círculo, há muitos milhares de anos atrás.



E então nós tocámo-nos, em seguida; continuámos a fazer o amor que tínhamos vindo a fazer horas antes -
- foi o copo de vinho que transbordou.
O sexo é quando o copo está tão cheio de vinho que naturalmente transborda.
É a abundância natural, o querer sempre mais, mesmo não querendo nada em tudo.

Ali, naquele sítio onde Deus fizera um círculo, há muitos milhares de anos atrás,
Estes dois corpos transpirados de desejo,
Exaustos de uma dor divina, de um ecxtasy religioso, existencial,
Alcoolizados pelo sangue de Deus,
Tocaram-se. Amaram-se. Os copos de vinho transbordaram. As velas apagaram-se.


Não há maior prazer do que a de iniciar alguém num mundo desconhecido -
Tirar a virgindade alguém, não a virgindade do seu corpo, mas sim da sua alma.
Eu já tinha lhe ensinado tudo que eu sabia, cada partícula de mim.
E, como boa professora, eu também aprendi algo completamente novo ao ensiná-lo.


Andavam nus, por aí, estes corpos, sem se tocarem. Experienciaram múltiplos orgasmos físicos, e tantos mais espirituais. Estiveram num sítio a que um dia alguém resolveu chamar de Paraíso. Não precisaram de falar muito, mas conseguiram chegar ao corpo, ao mais íntimo do corpo, antes de se terem tocado. Foram livres na sua entrega mútua e amaram de forma mortal sem esperar absolutamente nada em troca. Descobriram aquilo que faz o mundo girar em torno do Sol: não a procura do prazer em si, mas a renúncia àquilo que é tido como importante. That was Sacred Sex.


Autoria de CS,
Inspiração em 'Eleven Minutes', Paulo Coelho.